Ainda que a gula possa ser um dos pecados capitais, é inegável que comer é um prazer e, diga-se de passagem, o único que, em geral, usufruímos várias vezes ao dia. Os mais antigos, inclusive, com sua inegável sabedoria, costumavam dizer que enquanto a pessoa ou até mesmo a animal, está se alimentando bem, há esperança para quase todos os males.
Sem entrar em questões estéticas de padrões irreais de beleza corpórea, uma das questões de se comer é engordar, porém. Algumas pessoas nem passam por isso, tendo ou uma genética que, neste sentido, favorece àqueles que gostam de comer um tanto a mais, ou, fazem parte daquele grupo que se satisfaz com um único pedaço de pizza e dispensam a sobremesa, mesmo que seja o tal morango do amor.
Para todos os demais, a coisa não é tão simples, porque para além de possíveis problemas de saúde que o excesso de peso pode causar, ainda há a questão das calças que, rebeldes e ingratas, recusam-se a fechar de modo confortável. E comer, ao menos assim penso eu, é bom demais.
Para tormento dos apreciadores da mastigação, a cada dia surgem novas tentações. Sim, é fato que há opções mais leves, saudáveis, mas, excessos à parte, quase tudo fica bem melhor com leite condensado ou com queijo. Tudo bem que não dá para viver tomando por base o que dizem os “especialistas”, ei que, a cada dia, algum alimento é considerado herói ou colocado na lista dos vilões.
Que o diga o ovo, considerado um bandido, o porta-voz do colesterol e que, depois da reabilitação, é o amo e senhor dos esportistas e influencers. A pobre da tapioca, que já teve seus dias de glória, já se encontra rebaixada, perdendo seus dez minutos de fama. Então, comer de acordo com o que a mídia recomenda, penso, não é atitude muito sensata.
Os nutricionistas também não convergem exatamente em suas posições, havendo os radicais, para os quais comer parece um erro primário e que qualquer barriga é símbolo da preguiça e da falta de perseverança em viver de jejum intermitente. Prefiro, humildemente, os ponderados, já que o bom senso é medida que cabe em todos os lugares.
Certo que nossos antepassados, aqueles nascidos no começo do século passado, tinham uma vida bem diferente. Não precisavam, por exemplo, pagar ninguém para os ensinar a caminhar, já que isso era indispensável e rotineiro. Mas, por outro lado, ainda que sob a ótica de hoje, comessem parcialmente errado, muitos viveram até bem mais do que oitenta anos. Então, no fim das contas, eu concluo que tudo pode ser relativo, mesmos os ponteiros da balança.
Infelizmente, vive-se atualmente uma ditadura da magreza e da juventude eterna, que condena, em muitos casos, à morte pela busca de soluções milagrosas e de resultados impossíveis. É importante sim, observar o quanto o peso influencia na saúde e até no sentimento de bem-estar, mas, em paralelo, não podemos nos esquecer de ter comida no prato, além de uma benção, pode ser um momento de alegria, de comemoração.
Ninguém, salvo hipóteses extremas, ou em caso de veneno, morre se experimentar um quitute novo, o tal morango do amor, por exemplo, embora, comer uns dez de uma vez possa ser imprudente. Que padrão nenhum de beleza, estabelecido sei lá eu por quem e por qual razão, impeça os almoços em família, a macarronada, os bolos do fim da tarde ou, para quem assim o preferir, os lanchinhos de biscoito de arroz com tofu light. Se o tempero for o amor, a amizade, o companheirismo ou mesmo a solitude de um dia frio e saudoso, não haverá indigestão ou arrependimentos...