Já faz alguns anos que, em família, deixamos de comprar ovos de Páscoa. Ano após ano, tudo o que se vê são produtos com preços altíssimos, a maior parte incompatível com a quantidade de chocolate. Muito melhor e mais acessível comprar caixas de chocolates variados. As crianças do nosso núcleo familiar já se acostumaram e, atualmente, até preferem.
Lamento, porém, que as coisas tenham tomado esse rumo. Impossível não ter saudade do tempo em que minhas irmãs e eu ganhávamos ovos de tamanhos e cores variadas, encantadas com a imensa quantidade de bombons que os recheavam. Hoje, ao contrário, os recheios são brinquedos inúteis e descartáveis ou, alternativamente, míseros quatro bombons.
Certo que há exceções, que alguns ovos de Páscoa são realmente especiais na qualidade, produzidos com produtos especiais, mas, grosso modo, não estão ao alcance da maior parte das crianças brasileiras e, por óbvio, dos pais delas. Tenho notado também que a quantidade, nos supermercados, de ovos de Páscoa em exposição, tem diminuído ano a ano, talvez pelo fato que muitos sobrem nas prateleiras, à semelhança do que vem ocorrendo com os panetones.
Fato é que o brasileiro das classes média e baixa, a cada ano que passa, veem diminuído seu poder aquisitivo, pouco sobrando para o que não é essencial. O coelho da Páscoa que trate de arrumar outra função, ou se contente em entregar barrinhas tímidas de chocolate. Atualmente, inclusive, quando se fala em ovo de Páscoa, os brasileiros nem sabem mais se conseguem comprar sequer os ovos, quanto mais os de chocolate que, embalados em papel colorido, tornam-se mercadoria de luxo.
Os ovos caseiros, que em um passado recente, eram uma opção mais em conta, também perderam um pouco a mão. Considerando que o salário-mínimo, renda de cerca de 60% dos brasileiros, é pouco mais de um mil e quinhentos reais e que, na média, uma barra de chocolate custa entre doze e quinze reais, nem há opção diante de um ovo de Páscoa de duzentos e cinquenta gramas, a quase cem reais.
Tenho me assustado com os preços dos alimentos e, tenho certeza, não sou a única. Volto no tempo, nas minhas lembranças de mesa farta, com bacalhoada que comíamos na casa simples dos meus avós, entre os muitos ovos e coelhos de chocolate que ganhávamos e seguíamos comendo por semanas depois da Páscoa. Diante das bandejas de um quilo de bacalhau custando em média cem reais, fica bem salgado, porém, imaginar uma refeição para quinze pessoas, como costumávamos fazer na minha infância.
Em tempos de Páscoa, diante do cenário econômico, as famílias cristãs anseiam não apenas pelo simbolismo da Ressureição de filho de Deus, mas pelo milagre do renascimento da esperança de dias melhores. Enquanto isso, entretanto, seguimos fazendo malabarismos, substituindo o que é possível, abandonando o que se torna inacessível.
A Páscoa não perde seu significado por não haver chocolate e/ou bacalhau, é claro, mas o pão nosso de cada dia, rogamos que nos seja dado diariamente. Que não nos falte fé para acreditar, coragem para reagir e olhos para enxergar o que precisa ser mudado. Que cada família possa escolher o que terá na mesa e que o coelho da Páscoa, se convidado, venha repleto de doçuras. Que a Paz esteja com cada um de nós, renascida. Enquanto isso, diante da carestia, sugiro, para o momento, ovos de Páscoa virtuais. Além de gratuitos, ainda são ecológicos e fitness.